quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

Resenha: O próximo da fila - Henrique Rodrigues

Este é um daqueles livros difíceis de resenhar, do tipo que é preciso escolher com cautela as palavras que usarei para que não perca o foco. O Próximo da Fila me causou desconforto, e talvez por isso eu não tenha gostado tanto dele. Nos é dito a verdade cruel de algumas circunstâncias, e talvez por isso eu tenha ficado confusa. Espero me expressar claramente nesta resenha. 

Título: O próximo da fila
Autor: Henrique Rodrigues
Páginas: 192
Editora: Record
Ano: 2015

O próximo da fila é um original e divertido romance de formação, que retrata com leveza e poesia os sonhos, as frustrações e os medos de uma das épocas mais conturbadas que vivemos: a entrada na vida adulta. Após a morte do pai, o protagonista de O próximo da fila – de quem não sabemos o nome – se vê subitamente responsável por ajudar a mãe a cuidar da casa e do irmão mais novo. Jovem e inseguro, consegue emprego em uma rede de fast-food, trabalho que tenta conciliar com os estudos, e encontra seu primeiro amor – uma garota cujo sumiço misterioso será o derradeiro passo da dura e necessária transição para a maturidade.
O livro se inicia com um episódio entre um pai e filho. O pai dá uma bronca no filho por algum motivo banal, o que poderia ser julgado normal, mas pra mim foi extremamente rude e desnecessário. Como filha que sou, entendo que certas palavras nos machucam mais do que tapas, embora tapas também machuquem e muito o nosso psicológico. Aí já dá para entender que este livro não vai lá ser muito animador, e que essa criança talvez cresça com sérios problemas. 


O livro é dividido em quatro partes. Esta história ocorreu no Brasil dos anos 90. Um garoto com sua vida estável sustentado pelo pai, leva um choque depois de saber de sua morte, não que se importasse tanto. O pai era visto como uma figura temível e não de carinho e afeto, talvez por isso ele não tenha sentido tanto. Sua vida muda completamente e a fim de ajudar a mãe viúva e o irmão, sai em busca de um emprego.
Uma nota desvaloriza mais rápido que um sorvete derrete: o dragão cospe fogo todos os dias nas nossas caras.
Ele não sabia nada sobre a vida, teve que aprender cedo com as mazelas que passou para sobreviver. Na crise, diplomados e analfabetos tinham os mesmos empregos.O que valia era o esforço ao limpar o chão e o quanto você estaria disposto a desistir de sua vida para enfrentar jornadas exaustivas de serviço. Nessa situação, quanto mais se deixasse explorar, mais gostavam de ti.

O pai sustentava o filho com muito custo, em nenhum momento lhe deixou faltar o que comer e pagou seus estudos até o momento em que morreu. Sem o pai, provedor e homem da casa, a mãe tem medo de retornar ao estado de desespero pelo qual não passava há anos.
Gostaria de saber ler para poder entender as coisas escritas, mas isso também é um luxo de rico, e falar do assunto significava levar um tapa na cara, porque a obrigação é ficar dentro de casa ajudando, e depois arrumar um trabalho, e não ficar com delírio de gente besta que se acha melhor que os outros só porque vai para a escola.

Eles se mudam para uma casa bem menor, se desfazem de vários móveis, vendem o que podem para pagar a nova moradia. A viúva agora precisa sustentar a ela e a dois filhos, como fazer isso? Como recomeçar sem um rumo? O garoto passa a frequentar uma escola pública, um choque de realidade. Os alunos são diferentes, e o julgam sem o conhecer, passa a ficar boa parte do tempo sozinho, mais do que antes.
Alguns, pelas roupas e mochilas de marca, parecem até ter mais situação que eu tive. A escola nova é algo indecifrável.


Quando a situação aperta em casa, ele sai para procurar um emprego e ajudar na renda da casa. É descrito o momento em que ele se candidata para uma vaga numa rede de fast-food, até para limpar o chão ele parecia inviável. Ele é aceito nesta rede de fast-food e logo se mostra experiente com o caixa, o melhor dentre os funcionários. Entre os esfregões e os cadernos, anseia com uma vaga na universidade.
O aroma de gordura dá fome. Gostaria de ter dinheiro para pelo menos comprar um sanduíche dos pequenos. Mas me lembro que estou ali justamente porque não tenho.
Além da mãe e do irmão mais novo, há ainda duas tias que participam desta narrativa. Uma parece ser mais carinhosa com o garoto enquanto a outra é mais ríspida. Elas dão suporte à mãe dele e alguns palpites na vida deles.
Minha família se assemelha a uma panela de pressão. Não explodiu, mas dá para ver a fumacinha. A primeira tia, naturalmente, faz o papel do pino que faz barulho, intermitente, indicando que a fervura já se encontra num limite.

 Aqui, os personagens não tem nome, são tratados de acordo com uma característica marcante. A trama parece ser mais importante do que os personagens, quem eles são completam o papel que eles têm na narrativa.
Isso significa que o negro é rapidamente substituído por outro negro, por outro cristão, por outro poeta, por outro mudo ou por qualquer indivíduo cujo nome se escreva com inicial minúscula. 
O trabalho se mostra difícil, não porque ele não consegue concluir suas funções, e sim porque acada dia ele percebe o seu lugar naquela rede. A existência do personagem está ali somente para agradar o Padrão, ele não é um ser humano, ele é pura e simplesmente um funcionário que deve obedecer à regras.
Eu sou gado, todo mundo aqui é gado, essa é a minha vida. Eu sou cem por cento carne bovina.
O sentimento do personagem principal não é tão explorado. Só é destacado o quão chateante é a vida que ele leva, e os pequenos prazeres que ele tem ao chegar em casa com um lanche morno e murcho para o seu irmão mais novo, que acha aquilo o máximo. Chega a ser entediante certas partes da vida desse cara, que reflete tão bem na vida de quem a gente conhece, na nossa vida.
Você não vai mudar o mundo enquanto está fritando batatas.
Parece que ele sobrevive,  que os prazeres de seus atos são momentâneos, e por vezes controlados por um robô. Para mim, ele parece sem alma, sem vontade própria. Em determinados acontecimentos do livro, ele era só mais um, sem voz, sem medo, indiferente do que ocorria ali, do que ocorria com ele.
Antes de subir para o vestiário, recebo um pacote contendo o uniforme. Rapidamente me lembro das cenas iniciais de filmes de presídios, quando os detentos recebem aquelas roupas listradas. Rio sozinho da analogia, pensando que pelo menos não iria deixar os pertences numa caixa ao entrar.


Quem é o próximo da fila? Pode ser um estudante que está passando por ali com uns amigos no intervalo das aulas, pode ser um advogado no seu horário de almoço, pode ser alguém que não queria comer ali mas tem de fazer isso, pode ser simplesmente alguém que resolveu ir ali para expairecer. 

Quando se está no balcão, você é bombardeado por uma série de informações. O garoto passa a analisar os clientes e logo percebe um tipo de padrão.
No intervalo de minuto e meio entre a chegada e a saída com a bandeja, é possível capturar um fragmento de solidão, felicidade, fome, tristeza e esperanças de quem está do outro lado. Todos vêm e vão tão rápido... E não fazem a menor ideia do que existe do lado de cá.

[SPOILER ALERT] No meio disso tudo há uma garota, naquela fila, com os cabelos cacheados e distraída com seu livro. Ele se apaixonou por ela no segundo que a viu. E isso foi um dos piores erros que ele poderia cometer embora ele nunca tenha colocado dessa forma.  
O cabelo dela, os óculos dela, os livros dela. Não é só a primeira namorada. Ela ajudou a me dar um norte. Em poucos meses eu cresci, mais do que na vida inteira. Não tem sentido isso. A gente estava cheios de planos. Não tem lógica.
Em suma, nunca sabemos o que está por vir. É um turbilhão de sentimentos nessa vida, é um desconhecimento alheio, nós mesmos somos uma incógnita nesse mar de mistérios. O próximo da fila pode titubear para fazer o seu pedido, pode não fazer o seu pedido, desistir, pode afirmar com clareza o que quer, pode ser corajoso e assim por diante, tudo isso apenas em frente a um balcão, somente para fazer um pedido. Imagine o tanto de outras situações a que passamos sem saber do outro que está a nossa frente?

Espero que tenham se interessado por esse livro, para mim ele foi uma decepção como também foi uma surpresa. A bipolaridade de esperar de algo, que você prometeu não esperar nada, é fascinante. Qualquer dúvida que tenha sobre a obra, deixe nos comentários! Ficou com vontade de lê-la? Diz pra mim! 

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4 comentários:

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